● Capítulo 10 - A dissecação de cadáveres:
— O balde — disse Sewall para Edward, que olhava horrorizado para a incisão. — Por favor, alguém poderia trazer um balde? Uma vez que meu assistente aqui parece incapaz de qualquer movimento.
Risadas ansiosas irromperam aqui e ali diante de espetáculo de seu colega, tão autoconfiante, ter sua reputação publicamente desmoralizada. Enrubescendo, Edward pegou o balde de madeira na mesa de instrumentos e pousou-o no chão, para aparar as voltas do intestino gosmento que escorregava para fora da barriga.
— Cobrindo o intestino — disse o Dr. Sewall —, há uma membrana chamada omento. Acabei de rompê-la, liberando os intestinos, que agora vêem cascateando para fora do abdome. Em cavalheiros mais idosos, especialmente aqueles que foram muito indulgentes com os prazeres da mesa, esta membrana pode ser muito adensada com gordura. Mas, neste jovem espécime feminino, encontro poucos depósitos. — Com mãos ensangüentadas, ele ergueu o omento quase transparente para que todos o vissem. Então, inclinou-se à mesa e atirou-o no balde. Ouviu-se um estalo úmido quando a massa de tecido atingiu o fundo.
— A seguir, devo retirar todo intestino, que obstrui a visão dos outros órgãos. Embora todo açougueiro que tenha esquartejado uma vaca conheça a massa volumosa do intestino, os estudantes que assistiam à sua primeira dissecação freqüentemente se surpreende ao vê-la pela primeira vez. Primeiro, devo eviscerar o intestino delgado, soltando-o à altura da junção pilórica, onde termina o estômago...
Ele se inclinou com a faca e voltou trazendo uma extremidade cortada de intestino. Deixou-o escorrer pela borda da mesa, e Edward a pegou com as mãos nuas antes que caísse no chão. Desagradado, rapidamente jogou-a no balde.
— Agora, devo liberar a outra extremidade, onde o intestino delgado se transforma em intestino grosso, na junção ileocecal.
Novamente curvou-se com a faca e voltou a se erguer segurando a outra extremidade cortada.
— Para ilustrar as maravilhas do sistema digestivo humano, gostaria que meu assistente pegasse uma extremidade de intestino delgado e subisse o corredor, estendendo-o.
Edward hesitou, olhando com nojo para o balde. Com uma careta, enfiou a mão na massa de entranhas e pegou uma extremidade cortada.
— Vamos, Sr. Kingston. Vá até o fundo da sala.
Edward começou a subir o corredor, puxando a extremidade do intestino. Norris sentiu um cheiro horrível de vísceras e viu o aluno do outro lado do corredor tapas o nariz com a mão em concha para atenuar o cheiro. Edward continuou a andar, arrastando atrás de si o cordão fedorento de intestino até que este finalmente se ergueu do chão e ficou esticado, pingando.
— Vejam o comprimento — disse o Dr. Sewall. — Estamos olhando para, talvez, seis metros de intestino. Seis metros, cavalheiros! E este é apenas o intestino delgado. Deixei o intestino grosso no lugar. No interior de cada um de vocês está este órgão maravilhoso. Pensem nisso quando estiverem sentados digerindo seu dejejum. Não importa sua posição na vida, rico ou pobre, velho ou jovem, na cavidade de sua barriga você é igual a qualquer outro homem.
Ou mulher, pensou Norris, o olhar fixo não no órgão, mas no espécime estripado sobre a mesa. Até mesmo uma mulher tão bonita podia ser dissecada e reduzida a um balde que outrora habitara aquele corpo?